Análise: A Decisão Final da COP 30 e o "Mutirão Global".
- SETRABES 2030

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O documento intitulado "Global Mutirão: Unindo a humanidade em uma mobilização global contra a mudança do clima" (FCCC/PA/CMA/2025/L.24) , um rascunho de decisão proveniente da Sétima Sessão da Conferência das Partes servindo como a Reunião das Partes do Acordo de Paris (CMA.7) realizada em Belém, em Novembro de 2025, representa um marco crucial na governança climática global. Conhecida como a "COP da Verdade" , a reunião buscou restaurar a confiança, conectando a ciência, a equidade e a determinação política com a implementação prática do Acordo de Paris.
A análise deste texto revela não apenas a reafirmação de princípios fundamentais, mas também uma transição política decisiva: da negociação para a aceleração urgente da implementação.
I. Reafirmação de Princípios e o Contexto da Urgência
O texto inicia-se com uma poderosa contextualização legal e moral. Ele ressalta que, ao abordar a mudança do clima, as Partes devem respeitar e promover obrigações relacionadas aos direitos humanos, incluindo o direito a um meio ambiente limpo, saudável e sustentável, e os direitos dos Povos Indígenas e comunidades locais. Essa linguagem reforça o Acordo de Paris como um instrumento de desenvolvimento sustentável e erradicação da pobreza.
A Meta de 1.5°C e a Equidade
A decisão celebra o 10º aniversário do Acordo de Paris e reafirma o seu principal objetivo: manter o aumento da temperatura global bem abaixo de 2°C e prosseguir os esforços para limitá-lo a 1.5°C acima dos níveis pré-industriais.
O documento, no entanto, é realista sobre a urgência. Embora reconheça um progresso coletivo significativo (passando de uma projeção de aumento de mais de 4°C para uma faixa de 2.3–2.5°C ), ele enfatiza que isso "não é suficiente para alcançar a meta de temperatura". O texto lembra que limitar o aquecimento a 1.5°C exige reduções de 43% nas emissões de gases de efeito estufa até 2030.
A equidade e o princípio de responsabilidades comuns, mas diferenciadas e respectivas capacidades (CBDR-RC) são explicitamente reafirmados como centrais para a implementação do Acordo.
II. O Ciclo de Política de Implementação em Pleno Movimento
A Parte II do documento reconhece que o ciclo de política do Acordo de Paris está "totalmente em movimento" com a conclusão do primeiro Balanço Global (Global Stocktake). O texto marca a transição decisiva para o foco na implementação, destacando três pilares de transparência e planejamento:
1. Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs): Elogia as 122 Partes que comunicaram suas novas NDCs e as 80 Partes que apresentaram estratégias de desenvolvimento de baixas emissões de longo prazo.
2. Planos Nacionais de Adaptação (NAPs): Elogia as 71 Partes que submeteram NAPs, exortando aquelas que não o fizeram a fazê-lo até o final de 2025.
3. Relatórios Bienais de Transparência (BTRs): Saúda as 119 Partes que submeteram seus primeiros BTRs, reconhecendo que o quadro de transparência aprimorado está facilitando a compreensão dos esforços e promovendo confiança.
O reconhecimento formal da entrada em funcionamento deste ciclo é um ponto de inflexão legal, pois consolida os mecanismos de prestação de contas e revisão mútua do tratado.
III. A Mobilização: Iniciativas de Aceleração da Implementação
A urgência da ação levou à introdução de novos mecanismos cooperativos e voluntários, que dão nome e substância à decisão. O documento "resolve unir esforços em um mutirão global contra a mudança do clima". "Mutirão", um termo português para esforço coletivo e comunitário, reflete o apelo a uma mobilização global de todos os atores.
Duas iniciativas centrais são lançadas sob a orientação das Presidências subsequentes:
Acelerador Global de Implementação (Global Implementation Accelerator): Uma iniciativa cooperativa e voluntária destinada a acelerar a implementação em todos os atores (não-Partes e Partes) para manter 1.5°C ao alcance.
"Missão Belém para 1.5": Lançada pelas Presidências das 6ª, 7ª e 8ª sessões, visa permitir a ambição e a implementação das NDCs e NAPs, refletindo sobre a aceleração e o investimento em mitigação e adaptação.
Essas iniciativas sinalizam um engajamento pragmático e multissetorial, reconhecendo o papel vital de partes interessadas não-Parte, como a sociedade civil, setor privado e autoridades subnacionais.
IV. O Pilar do Financiamento Climático: Metas Ambiçõesas
O financiamento climático é tratado como um pilar de ação urgente, com o documento reafirmando a obrigação legal das Partes países desenvolvidos de fornecer recursos financeiros para auxiliar os países em desenvolvimento.
O texto estabelece e reforça metas financeiras ambiciosas para a próxima década crítica:
Meta de Financiamento Total (Todas as Fontes): Apela a um aumento do financiamento para a ação climática de todas as fontes públicas e privadas para pelo menos USD 1,3 trilhão por ano até 2035.
Meta de Mobilização (Liderança de Desenvolvidos): Enfatiza a necessidade de mobilizar pelo menos USD 300 bilhões por ano até 2035, com as Partes países desenvolvidos assumindo a liderança.
Financiamento para Adaptação: Reafirma a meta de, pelo menos, triplicar o financiamento de adaptação até 2035 , além de buscar triplicar os fluxos anuais de saída das principais entidades financeiras (como o Fundo de Adaptação) até 2030.
Loss and Damage (Perdas e Danos): O documento saúda a decisão do Conselho do Fundo para responder a Perdas e Danos de estabelecer um ciclo de reposição de recursos , reconhecendo a necessidade de ação e apoio urgentes para abordar perdas e danos.
Programa de Trabalho: É decidida a criação de um programa de trabalho de dois anos sobre financiamento climático para avançar no tema, incluindo a implementação da nova meta coletiva quantificada sobre financiamento climático.
O engajamento com a reforma da arquitetura financeira internacional e a cooperação em relação ao papel do comércio (com diálogos envolvendo a OMC e a UNCTAD) demonstra uma abordagem sistêmica para remover barreiras ao financiamento e à ação.
A decisão final da COP 30, a CMA.7 de Belém, é uma declaração política de intenção acelerada. Ela cimenta o Acordo de Paris como um tratado operacional cujo ciclo de política está plenamente estabelecido.
O espírito do Mutirão Global e o lançamento de ferramentas como o Acelerador Global de Implementação e a Missão Belém para 1.5 demonstram um esforço concertado para transformar compromissos em resultados concretos nesta década crucial. Ao atrelar a urgência científica a metas financeiras ambiciosas e a uma reafirmação inegociável de equidade e direitos humanos, o documento de Belém estabelece o tom para uma fase de implementação muito mais intensa e responsabilizadora do regime climático multilateral.
Acesse o documento a íntegra:





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